domingo, 27 de novembro de 2022

O MEU PRADO

 

MEU PRADO

j.torquato


No horizonte casas e coqueiros, a planta do pé ardendo sob o fogo ardente das areias escaldantes, areias cinza, soltas, rangentes que um dia fora lavadas pelo mar do Sobral ou do Trapiche da Barra. Sentir o sol no rosto como tomar banho de Maceió.

A brisa quente era famosa por saltar fora o suor e exibir a sede de uma água de côco.

Do lado de lá vizinho ao Trapichão do Trapiche, Bois e Cavalos dançavam danças próprias nos estábulos do Parque da Pecuária de Maceió, aguardando receber medalhas de premiação nas exposições. À noite havia cantiga nas “cornetas” penduradas em altos “postes” desde as românticas do Iê, iê, Iê e da MPB iniciante, as sertanejas de raiz, incluindo Jackson do Pandeiro, Luiz Gonzaga.

Nas ruas descalças do bairro, entre moitas e buracos de ximbras, ouvia-se Silvinho soluçante pedindo para o “mundo acabar naquela noite” ou Teixeirinha com sua namorada dizendo “não, não e não”, Wilson Simonal morando num pais tropical, Jorge Bem reclamando da desatenção da garota que “passa e nem me olha”, e o locutor gritava gol da Checoslováquia contra o Brasil. Os cantos da Patativa, Guriatã e do meu Curió enchiam as manhãs “pradenses.” O cheiro de gaiola sendo lavada, de banana e mamão, de alpistes e o choro de um recém-nascido.

A risada da turma no “garrafão” lixando mais um otário que tinha de passar na garrafa desenhada e riscada no chão, sob tapas e murros, o giro do pião “dormindo” na mão, as ximbras (bolas de Gude em outras plagas federativas) sendo jogadas no buraco. As “petecas” com mamonas e pedras nas guerras inter bairros Levada do cemitério dos Elefantes contra o Prado da Rua Caramurús, São Francisco, 21 de abril.

A Rádio Patrulha Fusquinha do o Cabo Freitas vindo nos expulsar do FRANGO ASSADO Grupo escolar Dr. José Maria Correia de Melo sob solicitação da Diretora Gisele que morava vizinho. E haja “pulada” de muros. E bolas brancas e vermelhas de borracha que “assava” peitos e canelas.

No cimo das areias ardentes, havia um céu azul lindo de poucas nuvens e muito vento de Novembro. Tempo de “soltar arraia” (pipa ou papagaio em outras línguas estrangeiras), com cordão reforçado em um rolo, com a “arraia caseira feita naquela manhã mesmo, com um rabo desmedidamente grande, cavalgávamos o vento do prado, em altas brisas galopantes, a balançar pendularmente, tornando-se pequena, triângulo diminuto e pesado para nossas forças de moleque”.

De volta ao quarto, depois da punheta e da reza obrigatória, acordávamos para vestir a farda e ir passar o dia na Escola Industrial Federal das Alagoas, fazendo “oficina” num horário e estudos, noutro. Andar de bicicleta dentro da escola, pegar castigo, servir de exemplo de mau-caratismo, desenhar história em quadrinho do Dr. Buçú (desenhos pornográficos) nos cadernos e vender por um cigarro cada leitura. Mas conseguir passar de ano bem bom, com mérito, e ainda ser o goleiro oficial da Seleção de 1966 substituindo um astro da Seleção da escola. Íamos participar dos jogos de Escolas Técnicas do Brasil no sul do país. mas nós não ligávamos para isso, queríamos só zoar e voltar para a turma do Prado a noite, fazer corredor polonês, mãos ao alto com peteca e pedra, garrafão, jogo de ferrinhos.

Oba era muita coisa que não cabe numa TV, ou num Smartfone de Hoje.

Havia alegria verdadeira nas brincadeiras que PARTICIPÁVAMOS física, mental e espiritualmente, crescíamos apalpando a vida, tocando na face da experiência. Amassando e engolindo derrotas e vexames. Tornava-mo-nos futuros adultos com lastros divinos adquiridos no

MEU PRADO.

 

 

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