MEU PRADO
j.torquato
No
horizonte casas e coqueiros, a planta do pé ardendo sob o fogo ardente das
areias escaldantes, areias cinza, soltas, rangentes que um dia fora lavadas
pelo mar do Sobral ou do Trapiche da Barra. Sentir o sol no rosto como tomar
banho de Maceió.
A brisa quente era famosa
por saltar fora o suor e exibir a sede de uma água de côco.
Do lado de lá vizinho ao
Trapichão do Trapiche, Bois e Cavalos dançavam danças próprias nos estábulos do
Parque da Pecuária de Maceió, aguardando receber medalhas de premiação nas
exposições. À noite havia cantiga nas “cornetas” penduradas em altos “postes”
desde as românticas do Iê, iê, Iê e da MPB iniciante, as sertanejas de raiz, incluindo
Jackson do Pandeiro, Luiz Gonzaga.
Nas ruas descalças do
bairro, entre moitas e buracos de ximbras, ouvia-se Silvinho soluçante pedindo
para o “mundo acabar naquela noite” ou Teixeirinha com sua namorada dizendo “não,
não e não”, Wilson Simonal morando num pais tropical, Jorge Bem reclamando da
desatenção da garota que “passa e nem me olha”, e o locutor gritava gol da
Checoslováquia contra o Brasil. Os cantos da Patativa, Guriatã e do meu Curió
enchiam as manhãs “pradenses.” O cheiro de gaiola sendo lavada, de banana e
mamão, de alpistes e o choro de um recém-nascido.
A risada da turma no “garrafão”
lixando mais um otário que tinha de passar na garrafa desenhada e riscada no
chão, sob tapas e murros, o giro do pião “dormindo” na mão, as ximbras (bolas
de Gude em outras plagas federativas) sendo jogadas no buraco. As “petecas” com
mamonas e pedras nas guerras inter bairros Levada do cemitério dos Elefantes
contra o Prado da Rua Caramurús, São Francisco, 21 de abril.
A Rádio Patrulha Fusquinha do
o Cabo Freitas vindo nos expulsar do FRANGO ASSADO Grupo escolar Dr. José Maria
Correia de Melo sob solicitação da Diretora Gisele que morava vizinho. E haja “pulada”
de muros. E bolas brancas e vermelhas de borracha que “assava” peitos e canelas.
No cimo das areias ardentes,
havia um céu azul lindo de poucas nuvens e muito vento de Novembro. Tempo de “soltar
arraia” (pipa ou papagaio em outras línguas estrangeiras), com cordão reforçado
em um rolo, com a “arraia caseira feita naquela manhã mesmo, com um rabo
desmedidamente grande, cavalgávamos o vento do prado, em altas brisas
galopantes, a balançar pendularmente, tornando-se pequena, triângulo diminuto e
pesado para nossas forças de moleque”.
De volta ao quarto, depois
da punheta e da reza obrigatória, acordávamos para vestir a farda e ir passar o
dia na Escola Industrial Federal das Alagoas, fazendo “oficina” num horário e estudos,
noutro. Andar de bicicleta dentro da escola, pegar castigo, servir de exemplo
de mau-caratismo, desenhar história em quadrinho do Dr. Buçú (desenhos
pornográficos) nos cadernos e vender por um cigarro cada leitura. Mas conseguir
passar de ano bem bom, com mérito, e ainda ser o goleiro oficial da Seleção de
1966 substituindo um astro da Seleção da escola. Íamos participar dos jogos de
Escolas Técnicas do Brasil no sul do país. mas nós não ligávamos para isso,
queríamos só zoar e voltar para a turma do Prado a noite, fazer corredor
polonês, mãos ao alto com peteca e pedra, garrafão, jogo de ferrinhos.
Oba era muita coisa que não
cabe numa TV, ou num Smartfone de Hoje.
Havia alegria verdadeira nas
brincadeiras que PARTICIPÁVAMOS física, mental e espiritualmente, crescíamos
apalpando a vida, tocando na face da experiência. Amassando e engolindo
derrotas e vexames. Tornava-mo-nos futuros adultos com lastros divinos
adquiridos no
MEU PRADO.
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