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A história de Monteiro Lobato e o petróleo brasileiro
Por - Leonardo Contesini - 05 nov, 2012 - 08:38
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A história de Lobato com o petróleo começa em 1927, quando o presidente Washington Luís o nomeou adido comercial nos Estados Unidos, reconhecendo o escritor como um grande representante dos interesses culturais do Brasil. Em sua temporada nos EUA o Lobato acompanhou de perto as constantes inovações tecnológicas e industriais daquele país, e convenceu-se de que o progresso norte-americano era um fruto de investimentos em ferro, petróleo e transportes, e que nós brasileiros deveríamos seguir o mesmo caminho dos EUA, copiando suas políticas de desenvolvimento.
No ano seguinte, Lobato visitou a General Motors e, entusiasmado, organizou uma empresa para produzir aço no Brasil. Para tentar levantar recursos, o brasileiro investiu na bolsa de valores, mas acabou perdendo todos o capital investido na crise de 1929.
Enquanto isso no Brasil Júlio Prestes fora apontado como candidado à sucessão do presidente Washington Luís na eleição de 1930. De Nova Iorque Monteiro Lobato envia uma carta de apoio ao candidato, por estar convecido de que a continuidade administrativa era o que o Brasil precisava para adotar uma política desenvolvimentista como a americana, uma vez que Washington Luís investiu maciçamente em transporte, e Júlio Prestes já havia realizado explorações de petróleo no estado de São Paulo. O escritor acreditava que era preciso “explorar o petróleo nacional para dar ao povo brasileiro um padrão de vida à altura de suas necessidades”.
A eleição foi realizada e Júlio Prestes eleito presidente do Brasil, mas não chegou a assumir devido à Revolução de 1930, encabeçada por Getúlio Vargas – o candidato derrotado na eleição – para depor o presidente Washington Luís e assumir o poder. Com a tomada do poder por métodos nada democráticos, começa a antipatia de Monteiro Lobato pelo presidente Vargas.
O escritor voltou ao Brasil em 1931, e passou a defender os investimentos em petróleo, ferro e estradas como pilares do desenvolvimento nacional. Foi quando Lobato criou a Companhia Petróleos do Brasil, uma empresa privada de capital aberto que vendeu 50% de suas ações em apenas quatro dias e iniciou a prospecção de petróleo no campo de Araquá, hoje a cidade de Águas de São Pedro. Com o sucesso das ações, Lobato conseguiria criar a Companhia Petróleo Nacional, a Companhia Petrolífera Brasileira e a Companhia de Petróleo Cruzeiro do Sul, e a Companhia Mato-grossense de Petróleo – com esta última pretendia perfurar poços próximo da fronteira com a Bolívia, que já havia encontrado petróleo em seu território.
Na época o governo getulista afirmava que não havia petróleo no Brasil, algo corroborado pelos empresários brasileiros com o argumento de que, se houvesse petróleo no país, as petrolíferas americanas já teriam descoberto. Não havia, até então, nenhuma jazida de petróleo ou de gás identificada ou explorada no Brasil, mas o poder público era incapaz de realizar explorações porque o Brasil simplesmente não tinha tecnologia, conhecimentos básicos e nem o capital necessário para o empreendimento.
Lobato contudo não estava apenas convicto da existência de petróleo no Brasil, como também suspeitava que os americanos já trabalhavam no mapeamento das áreas petrolíferas.
A empresa de Monteiro Lobato contava com técnicos norte-americanos, experientes na prospecção e extração de petróleo, mas era frequentemente sabotada por órgãos governamentais, sofrendo intervenções por motivos dos mais banais e acabou obtendo provas de suas suspeitas sobre a ação estrangeira na prospecção de petróleo no país.
Diante da situação Monteiro Lobato escreveu uma carta ao presidente Vargas em janeiro de 1935 reclamando das dificuldades impostas pelo Ministério da Agricultura em relação às atividades de suas companhias ao mesmo tempo em que denunciava confidencialmente as atividades da filial argentina da Standard Oil Company (que mais tarde se tornaria a Exxon/Esso) no país com a conveniente corrupção de fiscais do Serviço Geológico Nacional.
“[...]nossas melhores jazidas de minérios já caíram em mãos estrangeiras e no passo em que as coisas vão o mesmo se dará com as terras potencialmente petrolíferas. E já hoje ninguém poderá negar isso visto que tenho uma carta em que o chefe dos serviços geológicos da Standard ingenuamente confessa tudo, e declara que a intenção dessa companhia é manter o Brasil em estado de ‘escravização petrolífera’.”
Diante da omissão do governo em relação à sua denúncia, Monteiro Lobato publicou o livro “A Luta Pelo Petróleo”, onde denunciava o Serviço Geológico Nacional, órgão oficial encarregado das pesquisas, da conivência com a ação de grupos estrangeiros no Brasil ao acusar o governo de “não tirar petróleo e não deixar que ninguém o tire”.A militância e o avanço de Monteiro Lobato, contudo, interferiam nos interesses de grandes grupos e do governo federal. Em 1936 uma das sondas do escritor sofre intervenção federal e é interditada. O escritor segue adiante, levanta alguns recursos e finalmente encontra gás natural de petróleo a 250 metros de profundidade em Riacho Doce, Alagoas. A Companhia prossegue os trabalhos de prospecção. Neste mesmo ano Monteiro Lobato publicou outro livro, intitulado “O Escândalo do Petróleo”, que esgotou três edições no mês de lançamento, onde denunciava dois técnicos estrangeiros do Departamento Nacional de Produção Mineral pela “venda de segredos do subsolo a empresas estrangeiras”. No ano seguinte o livro é censurado pelo governo federal e o sagaz escritor edita um terceiro livro sobre o assunto: “O Poço do Visconde – Uma aula de geologia para crianças”.
Em 1938 o governo federal decidiu explorar um poço no município de Lobato, na Bahia (atualmente um bairro de Salvador) e constata a existência de petróleo. No ano seguinte cria o Conselho Nacional do Petróleo (CNP), que seria a primeira iniciativa para regular e estruturar a exploração de petróleo. Até então havia uma disputa entre empresários (caso de Lobato e das petrolíferas estrangeiras) e ideais nacionalistas, divulgados pelo governo getulista, sobre a exploração petrolífera no país. Uma alteração de última hora no decreto-lei que instituiria o CNP passou a considerar patrimônio da União todas as jazidas de petróleo em solo brasileiro, inclusive as ainda não encontradas.
Em 1941 Monteiro Lobato envia outra carta ao presidente Getúlio Vargas com severas críticas à política brasileira de exploração de minérios e acaba preso pelo general Horta Barbosa, que mais tarde se tornaria líder da campanha nacionalista “O petróleo é nosso”. Pela carta Lobato foi condenado a seis meses de prisão sem direito a banhos de sol. Depois de três meses recebeu indulto do presidente e saiu da prisão falido e desmotivado.
“Depois que me vi condenado a seis meses de prisão, e posto numa cadeia de assassinos e ladrões só porque teimei demais em dar petróleo à minha terra, morri um bom pedaço na alma.”
No mesmo ano foi descoberto o primeiro poço de exploração comercial, em Candeias, também na Bahia, e o governo avançou na prospecção de petróleo no país. Após a promulgação da Constituição de 1946 foi travado um grande debate em relação à política do petróleo, uma vez que o presidente Dutra defendia uma política econômica liberal, de abertura ao capital estrangeiro, o que significaria simplesmente a entrega da exploração do petróleo brasileiro aos interesses das multinacionais. Contudo, na época não havia no Brasil uma empresa nacional com capital e tecnologia necessários para a exploração de petróleo.Diante da discussão, o presidente Dutra enviou ao Congresso Nacional em 1948 um projeto de lei que ficou conhecido como o “Estatuto do Petróleo”. O projeto causou uma reação vigorosa dos nacionalistas que resultou na campanha “O Petróleo é Nosso!”, de ampla mobilização nacional, que conseguiu impedir a tramitação do Estatuto do Petróleo no Congresso e mais tarde contribuiu para o estabelecimento do monopólio estatal do petróleo e a criação da Petrobrás.
Monteiro Lobato, que havia sido preso por defender a nacionalização do petróleo na década anterior, concedeu uma entrevista à radio Record onde reafirmava sua posição favorável à campanha. Dois dias depois teve um espasmo cerebral e morreu aos 66 anos de idade, depois de perder em seus projetos empresariais todo o dinheiro que ganhou com seus livros.
“Chega. Não quero nunca mais tocar neste assunto de petróleo. Amargurou-me doze anos de vida, levou-me à cadeia – mas isso não foi o pior. O pior foi a incoercível sensação de repugnância que desde então passei a sentir sempre que leio ou ouço a expressão ‘Governo Brasileiro’…”